Sempre que datas comemorativas chegam, momentos de reflexão devem acontecer. No dia 1º de outubro, celebra-se o Dia Internacional da Pessoa idosa. Essas reflexões servem para que possamos entender a importância do contexto que existe por trás de cada data.
Assim, conseguimos viabilizar lutas em prol dos direitos da pessoa idosa, da mulher, da pessoa com deficiência ou de outros integrantes dos grupos chamados vulneráveis.
Minha experiência como delegado
Durante o tempo em que eu passei como delegado do idoso no Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV), eu tive a oportunidade de atender muitos casos, muitos me marcaram. Dentre eles, posso trazer uma situação relacionada a uma idosa que necessitava de apoio constante para a realização dos atos da sua vida diária. Ela precisava de auxílio para tomar banho, se alimentar, se locomover e era cuidada por uma filha em Aracaju. Aqui a chamaremos de dona Violeta, nome fictício apenas para ilustrar.
Dona Violeta, que tinha duas filhas, era cuidada por uma delas em Aracaju, aqui chamaremos de Vitória. Antes disso, ela tinha seus cuidados administrados pela outra filha, que morava em outro estado da federação, aqui chamaremos de Vanessa.
As primeiras suspeitas
Durante um tempo, Dona Violeta morou sozinha, tinha sua própria casa, mas à medida que foi envelhecendo, ela foi necessitando de mais cuidados e acabou deixando de morar só.
Logo depois, Vitória, que morava em Aracaju, foi ao estado onde ela morava com a idosa e a levou para Aracaju. Contudo, sempre que Vanessa ia visitar a mãe, ela percebia algumas coisas estranhas. Isso também era percebido nos contatos semanais que ela fazia por telefone. Ela reparava a mãe sempre muito calada, meio entristecida, monossilábica e isso foi chamando a sua atenção.
A constatação das condições precárias
Um dia, Vanessa apareceu de surpresa e encontrou a mãe em condições absolutamente precárias. Nesse dia, Dona Violeta estava sozinha em casa, sem qualquer tipo de higiene, urinando em uma cama da qual ela não conseguia levantar e sem comida.
Vitória tinha perfeitas condições de manter a mãe dignamente, mas utilizava o valor da pensão para benefício próprio, deixando a idosa à própria sorte, à míngua.
Além disso, a filha percebeu que a mãe aparentava estar em um estado de letargia muito grande. Sendo assim, dava indícios de que ela vinha sendo medicada para além da quantidade de remédios da qual ela precisava.
O contato com as autoridades
Esse foi o estopim para que Vanessa procurasse a Delegacia de Atendimento à Pessoa Idosa e com Deficiência e lá relatasse todo o fato. De imediato tomamos as providências para fazer uma apuração preliminar do contexto. Assim, reunimos alguns elementos e percebemos que havia a necessidade dessa mãe idosa ser removida daquele ambiente, onde as situações de maus tratos aconteciam.
Aliado a esse levantamento inicial, foi feito um contato com o serviço de saúde, que atende a domicílio. Na ocasião, eles relataram que, em várias oportunidades, tentavam entrar na casa e não conseguiam ter acesso. Houve então a necessidade de intervenção imediata e a remoção de pronto da idosa para ser entregue à filha Vanessa, que veio de outro estado para buscá-la.
A solução do caso e a lição deixada
A situação gerou a instauração de um inquérito policial e a apuração circunstanciada do fato. Só que, de antemão, veio a reflexão: “Que futuro nós queremos para nós se tratarmos os nossos pais dessa forma? Que tipo de humanidade nós temos conosco?”.
Essa situação me marcou bastante, embora não tenha sido o primeiro nem último caso de violência praticada dentro do ambiente familiar. Isso principalmente pela forma cruel com que a filha Vitória tratava sua mãe. Além do descaso e da medicação excessiva para que ela ficasse completamente aquém da sua condição, sem poder esboçar reação ou pedir socorro.
Então o que acabou acontecendo naquela situação foi um pedido desesperado de socorro vindo da filha daquela pessoa idosa. Nós prontamente acolhemos e, tempos depois, já na casa de Vanessa, a idosa celebrou seu aniversário de 85 anos. Recebemos fotos e vídeos e percebemos como ela estava alegre e livre daquela situação de abuso.
O que essa situação nos ensina?
Ao final dessa história, percebeu-se que, foi uma intervenção rápida e certeira. Dessa forma, essa situação revelou que as pessoas idosas, mais do que nunca, urgem por providências de cuidado, de atenção e, principalmente, de carinho e afeto.
É uma lição que se pode extrair e daí que, logicamente, além de termos que cuidar daqueles que nos deram a vida, precisamos ter compaixão e empatia. É preciso, acima de tudo, respeitar a voz da experiência e o cuidado que a pessoa idosa merece.
Então fica aqui um recado: partilhe das experiências e da vontade de poder sempre contribuir para trazer uma sociedade livre de opressões.
Isso serve para tornar o mundo um ambiente mais saudável e para garantir que as pessoas que mais precisam da gente na velhice tenham o amparo necessário. Além da proteção, tem o cuidado, o respeito, então pensemos como tratamos os nossos idosos, como permitimos que eles interajam com as gerações mais novas e que isso propicie um crescimento recíproco. Reflitamos e trabalhemos para que isso aconteça!
Chapéu Violeta (Erma Bombeck)
Aos 3 anos: Ela olha pra si mesma e vê uma rainha.
Aos 8 anos: Ela olha para si e vê Cinderela.
Aos 15 anos: Ela olha e vê uma freira horrorosa.
Aos 20 anos: Ela olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, decide sair, mas vai sofrendo.
Aos 30 anos: Ela olha pra si mesma e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas decide que agora não tem tempo pra consertar, então vai sair assim mesmo.
Aos 40 anos: Ela se olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas diz: pelo menos eu sou uma boa pessoa e sai mesmo assim.
Aos 50 anos: Ela olha pra si mesma e se vê como é. Sai e vai pra onde ela bem entender.
Aos 60 anos: Ela se olha e lembra de todas as pessoas que não podem mais se olhar no espelho. Sai de casa e conquista o mundo.
Aos 70 anos: Ela olha para si e vê sabedoria, risos, habilidades, sai para o mundo e aproveita a vida.
Aos 80 anos: Ela não se incomoda mais em se olhar. Põe simplesmente um chapéu violeta e vai se divertir com o mundo.
Humorista e colunista de jornais na década de 1960, a americana Erma Bombeck notabilizou-se por redigir textos sobre o cotidiano da mulher americana, destacando com humor, a extraordinariedade de viver o ordinário. Faleceu em 1996, aos 69 anos, vítima de câncer de mama e escreveu esse poema sobre o envelhecer, após descobrir que estava com a doença, fazendo-nos refletir sobre a necessidade de utilizarmos o chapéu violeta e aproveitarmos a vida enquanto temos saúde e vitalidade.
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